Brasília, 05 de fevereiro de 2024.
No dia 31 de janeiro de 2024, o Ministério da Educação (MEC), por meio da Portaria nº 61/2024, definiu que o novo valor para o Piso Salarial Nacional dos Profissionais do Magistério será de R$ 4.580,57 para a jornada de 40h semanais. Para o ano de 2024, foi estabelecido como reajuste anual o aumento de 3,62%, inferior à inflação acumulada em 2023, o INPC acumulado é de 3,71% e o IPCA é de 4,62%. Portanto, não houve ganho real para os professores.
A Lei nº 11.738/2008, que estabeleceu o piso salarial nacional para os profissionais do magistério, representou um marco para a valorização docente no Brasil. No entanto, o critério de reajuste adotado tem se mostrado inviável.
O critério de reajuste atual do piso tem como base a receita do Fundeb e o número de matrículas da Educação Básica, sendo calculado a partir da variação do valor anual por aluno mínimo (VAAF-MIN) do Fundeb dos últimos dois anos. O VAAF-MIN é obtido dividindo-se o total de recursos do Fundeb pelo número total de matrículas ponderadas da Educação Básica pública.
O critério atual de reajuste do piso em alguns anos promove ganhos reais elevados e, em outros, perdas, como em 2024. Em 2022 e 2023, os valores de reajuste foram significativamente acima da inflação, 33,2% (IPCA de 2021 foi 10,06%) e 14,9% (IPCA do ano anterior foi de 5,79%), respectivamente. Nota-se, assim, a ausência de previsibilidade pelo fato do critério de reajuste ser atrelado a variações econômicas de curto prazo. Assim, esse modelo reduz a capacidade de planejamento das redes públicas de ensino – que pagam – e dos professores – que recebem.
O critério também é insustentável fiscalmente, pois é atrelado às matrículas e nosso país vive uma transição demográfica, isto é, nossa população está envelhecendo e as pessoas têm menos filhos. De 2023 a 2060, estima-se uma queda de 21,7% na população de 5 a 19 anos. A queda no número de matrículas na Educação Básica já vem acontecendo ao longo dos últimos anos. Nos próximos 12 anos, estima-se uma redução de 5,7 milhões de estudantes, conforme dados do IBGE. Cumpre esclarecer que quanto menor o número de estudantes, maior o reajuste do piso, porém não há recursos orçamentários disponíveis que acompanhem esse ritmo. Em 2020, por exemplo, o piso teve um reajuste de 12,8%, enquanto a receita do Fundeb cresceu apenas 4,2%. Ou seja, os recursos orçamentários disponíveis não aumentaram na mesma proporção que o valor do piso.
Os municípios e os estados têm um desafio fiscal e orçamentário. Quase metade (43,5%) dos municípios brasileiros estão acima do limite de alerta de despesas com pessoal da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e 30% dos estados estão acima do limite de alerta com despesa de pessoal da LRF (SICONFI, 2022), ou seja, não conseguem garantir o pagamento do piso aos professores. Além disso, há o déficit previdenciário dos estados, lembrando que o reajuste do piso se aplica aos aposentados e pensionistas com direito a paridade, ou seja, todos os servidores públicos que ingressaram no serviço público até o dia 31/12/2003. Em 6 estados, a despesa total com inativos já supera a despesa total com ativos. O pior cenário ocorre no Rio Grande do Sul, onde a despesa total com inativos é cerca de 1,4 vezes a despesa com ativos.
Ademais, há que se fiscalizar o efetivo cumprimento do piso nacional do magistério pelas redes de ensino, quando houver disponibilidade orçamentária-financeira. Embora haja uma gama de municípios com dificuldades reais de cumprir o piso nacional do magistério, a valorização docente não pode depender da decisão dos governos da ocasião, e sim consistir em política de Estado.
É imprescindível que o critério de reajuste do piso salarial do magistério acompanhe a realidade econômica e demográfica do país, assegurando ganhos reais aos docentes e mantendo a viabilidade fiscal e orçamentária dos estados e municípios.
A Frente Parlamentar Mista de Educação, por meio da Coordenação de Desenvolvimento e Valorização de Professores, atua para promover a valorização dos professores. Nesse sentido, acreditamos e defendemos que:
- É necessário atualizar o critério de reajuste da lei do piso, pois para além da ausência de previsibilidade e insustentabilidade fiscal, permanece a insegurança jurídica de 2022 e 2023 que gerou diversos processos de judicialização por parte dos municípios. No debate público, vários atores defendem que o critério previsto na Lei 11.738/2008 perdeu a sua eficácia legal, pois esse critério faz referência ao VAA mínimo nacional do Fundeb calculado com base na Lei 11.494/2007, de regulamentação do antigo Fundeb, expressamente revogada pela Lei 14.113/2020, do novo Fundeb;
- O novo critério de reajuste da lei do piso precisa ser sustentável fiscalmente, previsível e gerar ganho real para os professores;
- A definição de um novo critério precisa ser baseada no diálogo e na construção de consenso entre Congresso Nacional, União, Estados, Distrito Federal, Municípios e sociedade civil. Dentre esses atores, os estados e municípios são essenciais, pois são eles quem pagam a conta e possuem autonomia, ou seja, capacidade de auto-organização, autogoverno e auto-administração, assegurada pela forma federativa de Estado, cláusula pétrea da Constituição Federal de 1988. Nesse sentido, vale destacar a iniciativa do MEC com a criação do fórum permanente para acompanhamento da implementação da política do piso salarial nacional para os profissionais do magistério público da Educação Básica, com representantes do MEC, Consed, Undime e CNTE (Portaria nº 1.086, de 12/06/2023).
Diante disso, reiteramos a importância da construção de diálogo e consenso entre os principais atores da Educação Básica para a elaboração de um critério de reajuste que seja sustentável e que promova a valorização contínua dos profissionais da educação. O novo critério deve assegurar ganhos reais aos professores, ser resiliente às flutuações econômicas e garantir aplicabilidade universal, respeitando a diversidade orçamentária dos estados e municípios.
A Coordenação de Desenvolvimento e Valorização de Professores da Frente Parlamentar Mista da Educação permanece atenta e dedicada a contribuir para o aprimoramento constante das políticas educacionais em nosso país.
Deputada Professora Goreth (PDT/AP)
Deputada Socorro Neri (PP/AC)